A divergência normativa entre órgãos governamentais e seus impactos na vida das empresas

NCM x TIPI x NF-e x CEST x UF’s

Nomenclatura Comum do MERCOSUL (NCM) x Tabela de Incidência do Imposto sobre produtos Industrializados (TIPI) x Nota Fiscal Eletrônica (NF-e) x Código Especificador da Substituição Tributária (CEST) x Legislação Interna dos Estados

Compreender o mecanismo de atualização das normas tributárias é fundamental para profissionais que atuam na área Fiscal/Contábil das empresas. Apenas para se ter uma dimensão, são editadas, em matéria tributária, mais de 350 mil normas por ano. Muitas dessas normas, como veremos, impactam diretamente codificações essenciais de uso obrigatório em documentos fiscais. Uma delas é a Nomenclatura Comum do MERCOSUL, mantida pelo Setor de Assessoria Técnica da Secretaria do MERCOSUL[i].

No Brasil, essas alterações ajustadas no âmbito do Mercado Comum do Sul são introduzidas pela CAMEX[ii], a quem compete, dentre muitos atos necessários à consecução dos objetivos da política de comércio exterior, alterar a Nomenclatura Comum do MERCOSUL (NCM) vigente no território nacional para garantia de uniformização com o Sistema Harmonizado de Designação e Codificação de Mercadorias (SH)[iii]. É sempre bom ter em mente que o Sistema Harmonizado é o idioma internacional do comércio exterior e serve de base para a formação da Nomenclatura Comum do MERCOSUL (NCM), assim como também serve de base para a NALADI, sigla para Nomenclatura da Associação[iv] Latino-Americana de Integração.

Também é de responsabilidade da CAMEX estipular as alíquotas do Imposto de Importação (II) que compõem a Tarifa Externa Comum (TEC) através da publicação de Resoluções. As últimas alterações na NCM feitas por este Órgão foram inseridas no cenário Nacional pelas Resoluções CAMEX nº 125/2016, 35/2017, 54/2017, 95/2017, 10/2018 e 11/2018.

Assim, todos os documentos fiscais em que a Nomenclatura Comum do MERCOSUL (NCM) é exigida devem se ater estritamente aos padrões estabelecidos na Resolução CAMEX nº 125/2016 e suas posteriores atualizações.

A título exemplificativo, podemos citar a Nota Técnica 2016/003 V.1.10, que traz a nova “Tabela NCM” vigente a partir de 01/07/2017 para uso na Nota Fiscal Eletrônica. Observem que a Nota Técnica em referência tem o objetivo de regulamentar as alterações na “Tabela NCM” utilizada pela Nota Fiscal Eletrônica – NF-e, informando ao contribuinte as inclusões e exclusões promovidas pela Resolução CAMEX nº 125/2016 e suas posteriores atualizações. Noutras palavras, a emissão de documentos fiscais em que o uso da NCM é obrigatório, não pode estar em conflito com as codificações e descrições determinadas pela CAMEX.

Outro ponto importante que tem relação direta com a questão ora tratada se refere à Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (TIPI), com efeito prático desde 01/01/2017. Aprovada pelo Decreto nº 8.950/2016, traz uma correlação de descrições de mercadorias, NCM’s e suas respectivas alíquotas para fins de tributação do Imposto sobre Produto Industrializado (IPI). O artigo 4º do referido Decreto deixa claro que a Receita Federal do Brasil (RFB) deve promover adequações na TIPI, sempre que não implicar em alteração de alíquota, em decorrência de alterações promovidas na NCM pela Resolução nº CAMEX nº 125/2016. Essa autorização legal reflete não só o objetivo das políticas tributárias de uniformização de codificações, como também reforça o entendimento de que os documentos fiscais em que o uso da Nomenclatura Comum do MERCOSUL seja de observância obrigatória, sigam os padrões delimitados (códigos e descrições) pela CAMEX.

Eventuais conflitos entre Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados – TIPI (Decreto nº 8.950/2016) e a Tabela que traz a Nomenclatura Comum do MERCOSUL (Resolução CAMEX nº 125/2016) devem ser sanados com prevalência desta última sobre a primeira.

Não é outra a situação das Normas publicadas no âmbito do CONFAZ[v]. Abrindo um parêntese, vale relembrarmos que compete a esse Órgão, precipuamente, celebrar convênios para efeito de concessão ou revogação de isenções, incentivos, sugerir medidas com vistas à simplificação e à harmonização de exigências legais, promover estudos com vistas ao aperfeiçoamento da Administração Tributária e do Sistema Tributário Nacional como mecanismo de desenvolvimento econômico e social, nos aspectos de inter-relação da tributação federal e da estadual, relativamente ao ICMS[vi]; etc. Ocorre que, frequentemente Convênios e Protocolos são divulgados com NCM’s e descrições já desatualizadas em relação à Nomenclatura Comum do MERCOSUL (NCM) estabelecida pela Resolução CAMEX nº 125/2016 e suas atualizações. O contribuinte se depara com situações complexas e embaraçosas no seu dia a dia.

Nesse contexto, recentemente, uma grande iniciativa para tentar unificar as informações relativas às operações sujeitas ao Regime de Substituição Tributária foi lançada.  Instituiu-se o Código Especificador da Substituição Tributária (CEST)[vii]. Os Convênios ICMS nº 92/2015 (atualmente revogado) e 52/2017 (e suas atualizações) codificaram as mercadorias passíveis de incidência da Substituição Tributária e antecipação de recolhimento do ICMS com o encerramento de tributação, relacionando suas respectivas NCM’s e descrições. A ideia da simplificação é bastante razoável e merece atenção, contudo, além da falta de um padrão que dificulta o cumprimento das novas regras, existem lacunas que precisam ser preenchidas pelos Entes normativos. Vejam que, muitas vezes, o Legislador dos Convênios/Protocolos relaciona um CEST a uma determinada NCM já desatualizada em relação à CAMEX. A Nota Fiscal Eletrônica, por sua vez, determina o uso da nomenclatura atualizada pela CAMEX, conforme falamos acima. O Legislador interno (dos Estados da Federação), outras vezes sequer atualizou suas normas para que exista uma coerência lógica e uniformizada de dados.

O § 3º da cláusula sétima do Convênio ICMS nº 52/2017 evidencia a delegação de responsabilidade do Fisco ao contribuinte, ao mencionar que este deverá informar nos documentos fiscais o código NCM/SH vigente, observado o mesmo tratamento tributário atribuído ao bem e mercadoria antes da reclassificação, agrupamento ou desdobramento promovido pela CAMEX. O fato é que não há uma linguagem única. É um cenário extremamente desafiador que pede profissionais gabaritados e empresas de inteligência que ofereçam soluções de alto valor agregado.

Apenas para se ter um parâmetro, muitos Estados, por não internalizarem as normas publicadas pelo CONFAZ em tempo hábil, acabam criando janelas em que a tributação fica desprotegida. O Estado do Tocantins, por exemplo, ao atualizar o item 8.35 do Anexo XXI do Regulamento[viii] do ICMS através do Decreto nº 5.674/2017 deveria ter retroagido a data de início de efeito da Norma para 01/07/2017, mesma data em que o correspondente item do Convênio ICMS nº 92/2015 (Anexo IV, item 8.0), atualizado pelo Convênio ICMS nº 25/2017 (cláusula primeira, inciso I) começou a surtir efeito. Mas não foi isso que ocorreu. A NCM 2202.99.00 (Outras águas minerais, potáveis ou naturais, gasosas ou não, inclusive gaseificadas ou aromatizadas artificialmente) começou a produzir efeito em 01/07/2017 em todo Território Nacional, conforme determinou o inciso I da cláusula primeira do Convênio ICMS 25/2017, ao mesmo tempo em que vigia no Estado a antiga NCM 2202.90.00 (Outras águas minerais, potáveis ou naturais, gasosas ou não, inclusive gaseificadas ou aromatizadas artificialmente) para a mesma mercadoria. Apenas em 06/07/2017 é que o Estado atualizou a informação através do Decreto nº 5.674/2017. Houve, portanto, uma janela de 5 dias em que a NCM e seu respectivo CEST estava em completa desarmonia com a Legislação interna da Unidade Federada.

O que estamos a dizer é que, muitas vezes, as Unidades Federadas não atualizam suas normas (legislação interna) no prazo entre a publicação e a entrada em vigor dos Convênios e Protocolos, ocasionando conflitos por inconsistência de informações ou, quando atualizam, precisam usar dos chamados “efeitos retroativos”. É um lapso temporal extremamente complexo que pode acarretar severos prejuízos para a empresa.

Os impactos dessa insegurança jurídica afetam diariamente a rotina fiscal/tributária das empresas. As constantes mudanças na Legislação tomam grande parte do tempo dos gerentes e analistas (fiscal, contábil, tributário, financeiro) que, além de terem que cumprir com todas as obrigações tributárias principais e acessórias exigidas pela Lei, ainda precisam estar atentos quanto a atualização das inúmeras operações que estão sob seus cuidados (Alíquotas, Redução de Base de Cálculo, Fundo de Pobreza, Margem de Valor Agregado, Isenções, Regimes Especiais, Notas Técnicas de Documentos Fiscais, Prazos de entrega de obrigações ao Fisco, Alterações de Layout, Novos Blocos de obrigatoriedade; Novos Campos de informações … etc.). Qualquer deslize pode ocasionar consequências nada agradáveis, como perda de benefícios e multas significativas.

Não há dúvidas de que um excelente serviço que inclua o monitoramento contínuo da legislação, a análise tributária promovida por especialistas, a classificação fiscal de mercadorias e o saneamento de informações fiscais/tributárias pode minimizar sobremaneira os impactos dessas questões tão complexas que rondam a vida do contribuinte.

Temos cada vez mais a certeza de que uma solução de inteligência tributária e monitoramento legal começa a fazer parte da necessidade primária das empresas.


[i] É formado por cinco membros plenos: Argentina, Brasil, Uruguai, Paraguai e Venezuela (suspenso na data desse artigo); cinco países associados: Chile, Bolívia, Colômbia, Equador e Peru; e dois países observadores: Nova Zelândia e México.

[ii] É um Órgão ligado à Presidência da República que tem por objetivo a formulação, a adoção, a implementação e a coordenação de políticas e de atividades relativas ao comércio exterior de bens e serviços, incluído o turismo, com vistas a promover o comércio exterior, os investimentos e a competitividade internacional do País.

[iii] É uma nomenclatura aduaneira, utilizada internacionalmente como um sistema padronizado de codificação e classificação de produtos de importação e exportação, desenvolvido e mantido pela Organização Mundial das Alfândegas (OMA). O SH é utilizado como ponto de partida para as pautas aduaneiras das partes contratantes da Convenção Internacional sobre o Sistema Harmonizado de Designação e Codificação de Mercadorias e para as estatísticas comerciais internacionais.

[iv] A Associação Latino-Americana de Integração – ALADI foi instituída pelo Tratado de Montevidéu, em 12.08.80, incorporado ao ordenamento jurídico nacional pelo Decreto-Legislativo nº 66, de 16/11/1981, para dar continuidade ao processo de integração econômica iniciado em 1960 pela Associação Latino-Americana de Livre Comércio – ALALC. Este processo visa à implantação, de forma gradual e progressiva, de um mercado comum latino-americano, caracterizado principalmente pela adoção de preferências tarifárias e pela eliminação de restrições não-tarifárias (Fonte: MDIC)

[v] É um Órgão colegiado formado pelos Secretários de Fazenda, Finanças ou Tributação dos Estados e do Distrito Federal, cujas reuniões são presididas pelo Ministro de Estado da Fazenda.

[vi] Constituição Federal, artigo 155, inciso II e § 2; inciso XII, alínea g; e Lei Complementar n° 24/1975.

[vii] Para saber mais detalhes sobre o Código Especificador da Substituição Tributária leia nosso artigo específico sobre o tema.

[viii] Decreto nº 2.919/2006 – Regulamento do ICMS do Estado do Tocantins.

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