Judicialização do aumento da carga tributária em São Paulo

Contribuintes judicializam o aumento da carga tributária promovido pelo Estado de São Paulo

 

O Governo do Estado de São Paulo, no final do ano passado, publicou uma série de Decretos promovendo alterações em diversos benefícios fiscais, bem como instituindo um complemento de alíquota para diversos segmentos econômicos.

 

Essa medida, vista pelos contribuintes do Estado como prejudicial ao desenvolvimento de suas atividades, principalmente diante do atual cenário de pandemia, ocorreu com a publicação dos Decretos nº 65.252/2020, nº 65.253/2020, nº 65.254/2020 e nº 65.255/2020. Posteriormente houve a publicação do Decreto nº 65.470/2021 excluindo alguns setores, como o de serviços de transporte e o de medicamentos genéricos.

 

O Decreto nº 65.353/2020, que estabeleceu um complemento de 1,3% na alíquota do ICMS em São Paulo para diversos segmentos econômicos, acabou impactando de forma bastante severa o setor automotivo (Substituição tributária para veículos automotores) que teve um aumento de 1,3% na alíquota do ICMS em 15/01/2021 e terá um novo amento de + 1,2% a partir de abril, totalizando 2,5%, caso o Governo não aceite as negociações do setor.

 

Já o Decreto nº 65.255/2020, ao alterar, entre outros, o artigo 11 do Anexo II do Regulamento do ICMS do Estado de São Paulo, que estabelece Redução de Base de Cálculo para Veículos Usados, mudou o percentual de Redução de 90% para 69,3%. Isso significa dizer que o as operações promovidas por concessionárias e estacionamentos, com veículos usados, passam a ter uma carga efetiva tributada de 30,7% (contra 10% antes da alteração). Segundo o setor, é um aumento que poderá colocar em risco suas atividades.

 

Outro exemplo que podemos citar para elucidar bem a questão está no setor de máquinas industriais e equipamentos agrícolas, disciplinados no Convênio ICMS nº 52/1991. O Decreto nº 65.254/2020, ao alterar o artigo 12 do Anexo II do Regulamento do ICMS do Estado de São Paulo, aumentou a carga tributária efetiva do segmento. Antes das alterações, quando as mercadorias tivessem como destino os Estados das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste ou ao Estado do Espírito Santo, a carga tributária era de 5,14% e, quando tivessem como destino os Estados das regiões Sul e Sudeste, exceto ao Estado do Espírito Santo, era de 8,80%. Com as alterações, as cargas efetivas aumentaram, respectivamente, para 5,5% e 9,5%.

 

Nesse contexto, diversos setores foram impactados, uns em menor proporção e outros com um aumento extremamente significativo.

 

Houve, de igual forma, a criação da isenção parcial pelo Decreto nº 65.254/2020, que acabou por onerar ainda mais a economia do Estado. O que antes tinha isenção total passou a ter isenção apenas em parte da operação. Exemplificando, uma mercadoria sujeita a alíquota de 25% terá uma parcela de 75% isenta e 25% tributada, conforme o escalonamento previsto no artigo 8º do Regulamento do ICMS do Estado de São Paulo.

 

Vale ressaltar que as alterações via Decreto encontram lastro na Lei nº 17.293/2020, que possibilitou ao Poder Executivo (SEFAZ – Equipe econômica do Governo) a redução dos benefícios fiscais no Estado, bem como a criação de um complemento de alíquota.

 

Todas essas inovações não agradaram em nada o contribuinte. O efeito é a multiplicação de ações perante os Tribunais.

 

Representantes da categoria de veículos usados, como o SINDIAUTO, obtiveram decisão perante a 3ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo garantindo o percentual do benefício antes do aumento da carga tributária, de forma que estão usando o percentual de 90% e não 69,3%. Na prática, a situação pode ser incontornável, na medida em que, futuramente, não sendo mantida a decisão, o revendedor de veículo usado precisará recolher a diferença aos cofres públicos (a depender de eventual modulação de efeitos da decisão). Se o benefício foi repassado ao consumidor, pode se tornar uma situação embaraçosa. Segue trecho da decisão publicada em 02/02/2021

 

“…

Vislumbro o direito alegado pela parte autora. O conceito, constitucionalmente previsto, de delegação de competência normativa permite que haja regulação mera complementação do estabelecido em um diploma legal, mas não autoriza a delegação irrestrita, sobretudo se se refere à majoração tributária, o que é reservado apenas para o Poder Legislativo, com todas as formalidades da aprovação de um diploma legal. Tal conceito é extraído da leitura do art. 150, I da Constituição Federal. A delegação irrestrita que aqui se discute parece conceder todo o poder outrora concedido ao Poder Legislativo (ou aos convênios) unicamente ao chefe do Poder Executivo Estadual, o que parece, num primeiro momento, ferir a vedação, repito, constitucionalmente prevista, de aumento do tributo por mero ato singular do Governador. Ante o exposto, defiro a tutela antecipada para determinar à autoridade que se abstenha de exigir o tributo com o novo redutor imposto pelo Decreto n. 65.255/2020, até o julgamento final desta demanda.

…”

(3ª Vara da Fazenda Pública – Foro Central São Paulo – Mandado de Segurança Coletivo nº 1003537-90.2021.8.26.0053 – Juiz Luis Manuel Fonseca Pires – Partes: Sindiauto x Fazenda Pública do Estado de São Paulo – 02/02/2021).

 

Em situações semelhantes, também direcionadas à Justiça, um dos argumentos da Fazenda do Estado se guia no sentido do impacto que as medidas judiciais podem causar caso haja um efeito multiplicador dessas decisões. Estimativas chegam a 7,3 bilhões em perda de arrecadação.

 

Outra questão judicializada se trata do complemento de alíquota de 1,3%, conforme ressaltamos no início do artigo. Uma empresa que atua no segmento de Fabricação de Equipamentos para Armazenagem ingressou com Mandado de Segurança (1047899-28.2020.8.26.0114) contra o Delegado Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo em Campinas (DRT-05) questionando a constitucionalidade da majoração dos tributos por meio de Decretos.  E o que se pede? Que a carga tributária ocorra pela alíquota de 12% (alíquota específica para a operação) e não pela alíquota majorada de 13,3%, nos termos da argumentação. Vejamos trecho da decisão liminar.

 

“…

Pois bem. A matéria de fundo deve ser analisada mais profundamente ao final, mas em vista da plausibilidade do direito pleiteado, considerando que a empresa impetrante demonstra irregularidades na cobrança do imposto, com aumento de alíquota por ato do chefe do executivo, entendo razoável possibilitar a discussão judicial com a suspensão da exigibilidade. Defiro, pois, a concessão de liminar para suspender a exigibilidade do crédito tributário relativo a 1,3% de acréscimo de alíquota previsto no Decreto nº 65.253/20 (art. 2º, II, “d”), afastando sua cobrança nas operações internas com empilhadeiras, até decisão ulterior.

…”

(2ª Vara da Fazenda Pública – Foro Campinas – Mandado de Segurança nº 1047899-28.2020.8.26.0114 – Juiz Wagner Roby Gidaro – Partes: – – – Fabricação de Equipamentos para Armazenagem Ltda x Delegado Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo Em Campinas – DRT-05 – 22/01/2021).

 

Para os setores de Hortifrutigranjeiros (Anexo I – artigo 36 – § 6º – RICMS/SP – Decreto nº 65.472/2021 – efeito 15/01/2021), Hortifrutigranjeiros para industrialização (Anexo I – artigo 104, § 2º – RICMS-SP – (Decreto nº 65.472/2021 – efeito 15/01/2021) e Insumos agropecuários (Anexo I – artigo 46, § 6º – RICMS-SP – Decreto nº 65.473/2021 – efeito 01/01/2021) o Governo publicou os Decretos mencionados revogando a submissão desses segmentos à isenção parcial. Lembrando que a isenção parcial tributa uma parte da alíquota, conforme já mencionamos.

As mudanças promovidas pelo Estado na Legislação ainda são recentes e, agora, estão começando a surtir efeitos diretos nos setores impactados. Há diversas negociações com o Governo para que exista recuo nessa majoração, ao argumento de se inviabilizar por completo a atividade econômica.

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